A natureza rude do Amazonas é uma colossal arena. Em cada árvore, cada galho, cada ramo, cada folha, há uma natural disputa entre as espécies. Símios, ofídios, insetos, aracnídeos, ... mas apenas os homens são os intrusos. A imensa árvore hidrográfica é margeada por verdes copas, caules imensos e extensas raízes, dimensionando a pequenez dos homens. Esta é a topografia virgem da última carta bio-geográfica da Natureza íntegra do Planeta Terra.
Da floresta flui a sonoridade de notas dissonantes, fusas, semi-fusas, colcheias, semi-colcheias comprovando a execução da vibrante Sinfonia da Natureza, nos infinitos palcos dos ecossistemas Amazônicos. São interpretações de um afinado coral de aves, pássaros, quadrúpedes e insetos, num constante cantar, uivar, chiar, rosnar, grasnar, piar, fungar e berrar.
O andamento musical é determinado pelo movimento ritmado das patas nas folhagens, das unhas nos galhos, dos focinhos no chão, dos bicos em cantigas. É um dinâmico movimento teatral, numa encenação de bichos com penas verdes, amarelas, azuis, pretas, vermelhas, branca e semi-tons especiais.
Ainda neste sagrado manto vegetal se escondem onças, sucuris, cascavéis, patos selvagens, morcegos, tamanduás, ratões, araras, periquitos, tucanos, papagaios, macacos raros e milhares de espécies ameaçadas de extinção,... como muitas “tribos indígenas” e, na continuidade das devastações indiscriminadas e irresponsáveis, até - atingir - toda raça humana. E a destruição das espécies ainda não catalogadas e nem estudadas? Até que ponto a Natureza resistirá à tantas agressões? As próprias lendas, Iara, o Boto, a Currupira, o Boiúna, o Irapurú, não são folclores ameaçados?
Num clorofílico labirinto com peixes raros, orquídeas lindas, vitórias régias, jacarés e piranhas, - que fascinam e dão medo – a vida prossegue equilibradamente. São rios, ilhas, praias, canais, baias, restinga, manguezais, que fusionam água e nuvens, terra e céus, numa singular, faustosa e migratória paisagem Amazônica.
Ossos e carcaças, espinhos, chifres e dentes, galhos e conchas marinhas constituem parte dos restos de vida orgânica, descrevendo e dimensionando a magnitude da constante “luta das espécies.”
As lentes fotográficas ou filmadoras são incapazes de fazer uma gravação tão criteriosa, quanto às impressões captadas pelos olhos do espírito. A alternância das águas e terras, em igapós e igarapés geram dúvidas, no significativo “ballet” destes elementos: são as terras que mergulham na paisagem? ... Ou as águas que se escoam e somem? Estes não são muitos dos segredos, magias e mistérios guardados pela Confraria zôo-botânica do Amazonas?
Há muito que se estudar, pesquisar e realizar de concreto pela preservação dos fascinantes ecossistemas Amazônicos. Mas, será que a apocalíptica devastação continuará gananciosamente? Isto não consagra um flagrante desrespeito à Constituição do Brasil e às Leis, Tratados Internacionais promulgados e amparados em “Declarações”? As coisas continuarão impunes até a morte do último bicho? ... Ou extinção do último tronco de árvore? Até a última poça d'água?
( Jornal “A Opinião Pública” – Pelotas, RS. 20 / 02 /1991 )
Gilnei Fróes
Muito bom texto...
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